domingo, 4 de maio de 2008

O liberalismo e o socialismo de mãos dadas

Liberalismo de Esquerda, por Tiago Barbosa Ribeiro

Neste texto o autor procurou alinhar o liberalismo com o socialismo, que como eu entende que um só pode ser a expressão incompleta do outro, mas explorou um argumento que me parece complexo. Quer desenvolver a ética do mérito para justificar as desigualdades à chegada.

O mito da meritocracia

Esta tese parte de um princípio correcto que dependente de uma tarefa impossível que é identificar (quanto mais anular) todas as desigualdades à partida, de forma a desenviesar a hierarquia social à chegada, que se quer o seu justo e cristalino reconhecimento, a meritocracia. O problema é que isto é um mito porque ninguém consegue anular todas as desigualdades à partida, e as desigualdades que não se anulam à partida serão as desigualdades à chegada. Um determinismo hegeliano para os que comungam desta "espécie de calvinismo ateu".

Há que mudar o discurso e sustentar melhor a razão pela qual os indivíduos se podem distanciar uns dos outros. Não é porque tenham o mérito como argumento moral, porque essa definição é completamente arbitrária, e no limite não há nada que a sustente.

Marx defendia que devíamos caminhar para uma economia que distribuísse "De cada um segundo as suas possibilidades, para cada um segundo as suas necessidades". Nós somos indivíduos, e da nossa individualidade inferimos que temos necessidades distintas. Ora se temos necessidades distintas não podemos ter a mesma fatia do produto, a menos que na definição de "valor" estivesse a "necessidade". O mercado é alheio a este tipo de definições, embora o conceito de "valor" não seja alheio ao de mercado.
Da mesma forma que nos sentimos injustiçados sempre que somos forçados a aceitar que uma condição, sobre a qual não podemos actuar, nos limite a satisfação das nossas necessidades, também nos sentiríamos injustiçados e descompensados com um sistema que nos impedisse de ascender para ir satisfazendo necessidades ilimitadas.

A necessidade da desigualdade

Em mãos ficamos com uma pescadinha de rabo na boca, porque estas duas vontades acabam por chocar. Entre a vontade de satisfazer necessidades ilimitadas, e ao mesmo tempo anular as desigualdades que essa mesma satisfação provocou.

"Mas uns indivíduos são física ou moralmente superiores a outros e, portanto, fornecem mais trabalho no mesmo tempo ou podem trabalhar mais tempo (...) Com igualdade de trabalho e, por conseguinte, igualdade de participação no fundo social de consumo, há portanto uns que efectivamente recebem mais que os outros, uns que são mais ricos que os outros (...) Mas estes defeitos são inevitáveis na primeira fase da sociedade comunista"
Karl Marx na Crítica ao Programa de Gotha

Não é por acaso que Marx distingue a "fase inferior", onde a remuneração diferencia o trabalho simples e o trabalho complexo, da "fase superior" do comunismo. É exactamente porque sem incentivos não se maximizam as contribuições para o bolo ("de cada um segundo as suas possibilidades..."), e se não se maximizarem essas possibilidades, aquilo que se deixa aos restantes que por si só não conseguíram satisfazer todas as suas necessidades, acaba por ser inferior ao que teriam na ausência desses mesmos incentivos.

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sábado, 22 de março de 2008

Terceira intifada no Tibete




É nestes vídeos que se confirma o relato de James Miles, correspondente para o The Economist, o único com autorização para reportar os confrontos em Lhasa. Conta-nos que enquanto entrevistava um monge no interior de um mosteiro, um jovem de etnia Han, a etnia maioritária na China, pede auxílio e refúgio no interior, aterrorizado por vândalos que perseguem e agridem o comum transeunte, culpado por associação étnica, ao mesmo tempo que pilham e incendeiam o seu pequeno comércio, como podem ver neste testemunho de um turista australiano.
De um dos incêndios ateados, 5 raparigas chinesas viriam a falecer, como aqui vem noticiado.

O rastilho foi incendiado por um boato, de que a polícia chinesa teria assassinado monges junto ao templo Jokhang, o resto foi a reprodução fiel de uma Kristallnacht ou de outros progroms pouco recomendáveis.
Há algo que escapa nas manifestações que pululam um pouco por todo os consulados da China no mundo ocidental. Aliás, escapa muita coisa sempre que se fala do Tibete. Há uma sinistra personagem que capitaliza sempre o descontentamento tibetano perante a ditadura que mais viola os direitos humanos a nível mundial.
O regime feudal que o pateta alegre chefiou não lhe deu créditos, parece que precisa de contrabalançar com os crimes dos outros para se sentir feliz.

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O ateísmo agnóstico e a domesticação das religiões

Da caixa de comentários do fiel inimigo, vale a pena compendiar esta discussão para desmontar os preconceitos que repousam nas alminhas mais conservadoras. Tem a ver com questões que o eco deixado pela religião numa certa direita dogmática, não deixou que se desenvolvessem fora dos trilhos da esquerda, por medo de serem apanhados e culpados por associação. O facto de se ter levantado novamente esta questão, prova isso mesmo.



O ateísmo agnóstico

O ateísmo e o agnosticismo respondem a questões diferentes, e por isso, não são mutuamente exclusivos.

(1) Deus existe?
(2) Acreditas em Deus?

O agnosticismo e o ateísmo, respondem a (1) e (2) respectivamente. O agnosticismo, como o definido por Huxley, é um método e não uma crença, que aceita que fiquem sem resposta as questões que nos transcendem. Esta é uma posição partilhada por muitos teístas, exactamente porque separam a crença do conhecimento, e não tomam uma pela outra. Uma crença não tem que ser demonstrada (teísmo), tal como a sua inexistência (ateísmo).
Se me perguntarem se eu acredito em Deus, eu direi que não. Serei um ateu, alguém que não tem a crença em entidades divinas. Não ter a crença numa entidade divina, não é a mesma coisa que ter a crença na inexistência de uma entidade divina (este é o busílis da questão). E por isso posso ser ateu (não ter crenças) e agnóstico (deixar sem resposta as dúvidas existenciais que sustentam as crenças dos outros). É exactamente isso o que me considero.

A domesticação das religiões

Convém começar por explicar que a domesticação das religiões e a redução da sua influência nos poderes públicos foi sempre feita por imposição da sociedade, e não por iniciativa da própria. É portanto a sociedade que domestica a igreja, e não a igreja que se domestica a ela própria.
Tanto assim é, que a mesma crença que aqui aparenta ser um "felino domesticado", no Rwanda ou no Uganda serve de encosto moral a exércitos genocidas, raptores e que utilizam crianças nas suas fileiras para a prossecução dos objectivos mais lunáticos.


(clicar na imagem para aprender mais...)

As sementes do ódio estão na bíblia. A submissão do ser humano aos superiores desígnios da escolástica. O abandono do pensamento racional.
A religião é uma poderosa arma que não pode cair nas mãos erradas. Aquilo que se foi fazendo na Europa resume-se a um longo e diplomático processo de alegorização dos disparates bíblicos, feita com complexas hermenêuticas e paciência de santo. A bíblia também condena à morte os judeus, os homossexuais, os infiéis, os ateus, os adúlteros e adúlteras. Hoje ninguém liga. Ao invés, um enorme número de muçulmanos ainda liga a estes disparates. É só esse trabalho de domesticação que têm que fazer.

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terça-feira, 11 de março de 2008

A avaliação dos professores



A marcha da estagnação por Valupi.

Sim, e agora? por João Pinto e Castro

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domingo, 2 de março de 2008

Da prova de ganância



"O presidente do Banco Central do país mais pobre da União Europeia, ganha cinco vezes mais que o presidente do Banco Central do país mais rico do mundo!"

Um assunto muito bem explorado em A verdade [pdf].

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quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Na blogosfera

Liberdades positivas e negativas, por João Vasco

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domingo, 6 de janeiro de 2008

A laicidade é uma chatice

A Igreja Católica é uma filha que foi mimada pelo Estado. Nos dias de hoje, e apesar da madura idade que leva de comida na mesa, cama e roupa lavada, não se sente minimamente compelida a abandonar a alçada dos pais. Pior, reage mal quando se toca no tema.
"Vai lá à tua vida...", dizem os pais desnaturados (e irmãos emancipados), cansados do paternalismo de fachada. O infante pensa "Se o Estado já não me quer cá em casa, é porque não gosta de mim". A birrinha e os amuos aparecem. Acusam de "anticatólicos" ou "laicistas radicais" aqueles que querem ajudar a igreja a sair do defeso.
Vou dar-lhes um pouco de atenção.


"A desforra de Deus" de Esther Mucznik.

Como doutrina e como prática, a laicidade radical que considera a religião como um factor de atraso e obscurantismo a banir do espaço público

A noção de que a religião é um factor de atraso e obscurantismo não se encontra no conceito de laicidade ou laicismo, é apenas a mais descarada constatação da realidade. A noção de imparcialidade e a não discriminação, pela qual se impede que o Estado tenha qualquer poder religioso e as igrejas qualquer poder político, talvez esteja mais perto do alvo.

"Se não tiveres Deus", afirma T.S. Eliot, "terás de te prostrar perante Hitler ou Estaline." Certo ou errado, a verdade é que a religião tem sido frequentemente um fermento no combate às ditaduras políticas e militares

Certo ou errado, a verdade é que o cristianismo de Hitler não foi um factor que o impedisse de realizar a sua obra, pelo contrário, foi aliás em nome do Criador que o fez, como explica no Mein Kampf. Já Estaline herdou um povo crédulo e fácil de maniatar.



"O fanatismo da tolerância" de Vasco Pulido Valente

O Governo socialista de José Luis Zapatero resolveu suprimir o ensino religioso (...) E obviamente ninguém pede que se ponha fim a uma certa propaganda islâmica ou, se preferirem, de ensino corânico

Quem apenas dirige a vista, em leitura diagonal, não percebe que o que aqui está em causa é se o ENSINO PÚBLICO deve ou não discriminar positivamente uma dada confissão religiosa e se, no ENSINO PRIVADO, deve ou não haver o direito de leccionar qualquer religião, seja ela cristã ou muçulmana.
Se respondermos Não e Sim, respectivamente, às duas questões acima colocadas, ficaremos com uma noção de justiça um pouco diferente daquela que VPV quis passar, que é a de que se beneficia o Islão em detrimento do Catolicismo, quando a verdade é a de que se colocam as duas confissões ao mesmo nível.

Em Espanha, e na “Europa” inteira, ninguém se lembraria de criticar ou de inibir manifestações

Aqui os verbos criticar e inibir aparecem quase associados, num raciocínio que pode levar o leitor a pensar que o Governo de Zapatero inibiu uma manifestação, quando o que fez foi criticá-la. E isso mais não é do que um direito que lhe assiste.

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quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Nova lei do tabaco



Passeei por aí na expectativa de encontrar argumentos bem fundamentados contra a nova lei do tabaco [PDF]. Não encontrei nada, e porquê? porque a lei é fundamentalista. É fundamentalista no que toca a prescindir dos direitos positivos dos fumadores em prol dos direitos negativos dos não fumadores (exceptuando à regra os hospitais psiquiátricos e as prisões). Tendo em conta que a população fumadora se estima na casa dos 30%, podemos afirmar que incrementámos a liberdade numa função imaginária onde a maioria dos não fumadores ganhou um direito sobre um, até então, direito da minoria dos fumadores.
É uma questão de prioridades com a qual concordo e que por não ter muitas bases lógicas para ser refutada, retira a substância aos seus detractores e condena-os ao ridículo, que passo agora a expor:


O argumento da ingerência do Estado na propriedade privada

É um argumento que já foi lançado aqui por João Miranda e oportunamente rebatido por Rui Tavares, que passo a citar:

"O João Miranda não me leve a mal, mas este post parece uma daquelas listas de pureza ideológica que se dava aos maoistas para usarem na auto-crítica. Ainda por cima há coisas que não colam bem. Veja o ponto 6:

6. A propriedade privada, cara a qualquer liberal, é considerada relativa. O mesmo é dizer que a propriedade privada deve ser parcialmente colectivizada.

Vamos dizer que a propriedade privada é cara a qualquer liberal. Quer isso dizer que ela não possa ser considerada relativa? Só pode ser valorizada se for absoluta? Só se pode ser liberal se se considerar a propriedade absoluta? Nesse caso, John Stuart Mill não é liberal, e tenho impressão que está longe de ser o único. Tenho até impressão que o liberalismo clássico valoriza a propriedade privada precisamente porque ela é relativa, e que entre a propriedade e a justiça escolhem a justiça. Podem considerar — como você — que a justiça emerge de em regra se respeitar a propriedade privada, mas isso não quer dizer que ela seja absoluta. Quer apenas dizer, como diziam os romanos, que a propriedade é o jus utendi et abutendi res sua quateus juris ratio patitur. Ou seja, o direito de usar e abusar de uma coisa sua, sim, mas enquanto a razão do direito o permita.

Como diz o Tiago e bem, a razão do direito não me permite que eu, enquanto proprietário de um espaço público, não deixe lá entrar pretos. Não é justo, e a lei deve restringir o direito de propriedade nesse caso. O que não poderia acontecer se toda a propriedade fosse absoluta e todo o tipo de propriedade fosse igual (uma loja minha não é como a minha casa, onde eu posso efectivamente não deixar entrar sócios do sacavenense ou coxos, nem que seja apenas por capricho)."


O argumento da construção espontânea contra as engenharias estatais

Todos sabem que, auto-denominados liberais, têm um problema com o Estado e vivem a despejar os habituais trejeitos contra tudo o que o Estado faz, mesmo quando o faz bem.
Estamos a falar de pessoas que fazem fé em escritos mais jurássicos que os marxistas. Estamos a falar de encarnações de profecias como as de Thomas Jefferson que dizia: "The course of history shows that as a government grows, liberty decreases". Estamos a falar de gente que tem a convicção real de que só o Estado é que é uma força limitadora da liberdade individual, que só o Estado é que pisa os cidadão, negando por isso a realidade a céu aberto. Não é só o Estado que pisa os cidadãos, por vezes os cidadãos também se pisam uns aos outros, também limitam a liberdade uns dos outros. E é aí que entra o poder do Estado para garantir que isso não acontece, ou seja, para incrementar e instituir mais liberdades para os cidadãos.
Apraz-me dizer que esta mesma ideia está expressa no texto de João Miranda que atrás linkei:

"2. O plano visa destruir elementos sociais que são parte de uma sociedade complexa e que evoluiram espontaneamente sob a alegação que tais elementos sociais violam as liberdades individuais. Ou seja, aquilo que resultou da liberdade, que evoluiu espontaneamente, é contestado porque viola a liberdade."

E não há melhor forma de pôr as coisas. Não é só a liberdade que resulta da liberdade. É exactamente para isso que serve o Estado, para evitar que a liberdade de uns colida com a liberdade dos outros.
Infelizmente o próprio desmancha no ponto 7, aquilo que escreve no ponto 2:

"7. A liberdade individual é limitada porque a liberdade individual produz resultados que determinadas pessoas não gostam."

Não é porque determinadas pessoas não gostam, mas sim porque - como vem referido no ponto 2 - "viola a liberdade".

Para terminar este ponto. Se a maximização da liberdade individual passa por uma regulação do Estado, então um liberal que não quer que o Estado regule não defende a maximização da liberdade individual.

Argumentum ad Hitlerum



Já no fim de linha surgirá este conhecido silogismo, normalmente incompleto (concluído mentalmente) ou construído de forma lateral.

(1) Os nazis eram a favor da proibição do fumo em espaços fechados;
(2) Os nazis são criminosos;
(3) logo, a proibição do fumo em espaços fechados é uma lei criminosa e/ou nazi.

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quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Subprime



O vídeo que recomendo, e que arranjei aqui, tenta explicar a crise do crédito hipotecário de alto risco (subprime) já aberto pela curiosidade que me suscitaram estas explicações.

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Buraco negro no calendário

"os velhos trabalham, os velhos copulam, os velhos não têm um instante, um momento para fugir ao prazer, para se sentarem e pensar, ou se alguma vez, por um desastroso acaso, uma tal falha no tempo se escancarasse na substância sólida das suas distracções, há sempre o soma, o delicioso soma"

in
Admirável mundo novo

Os feriados são uma parvoíce. Os passatempos também. No fundo um feriado é um passatempo coercivo, forçam-se as pessoas a não trabalhar, e por arrasto ninguém se diverte. Isto é, se o nosso divertimento depender de trabalho alheio, aí é que ficamos sem poder fazer nada. Não nos divertimos, não trabalhamos, nem temos soma.
O ser humano gosta de ter o que os outros não têm. Regozija-se a pensar nos que estão a bulir no duro, enquanto ele está nas suas merecidas férias. O tempo que todos têm não vale nada.

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